sábado, 3 de janeiro de 2009

Palavras torpes

Não há mais emoção. Há apenas vazio. Ao tentar sentir, quase morro. O que de mais valioso tinha, hoje não mais me pertence. Foi dividido. Oxalá, multiplicado. Não posso saber, afinal, de mim já partiu.
Palavras torpes são profanadas por esta voz dissonante e, raramente, plácida.
A miscigenação da alma, enfim, ocorreu.
Quem sou, pois?
E, ao soar dessa pergunta, que não cala diante do barulho dos auto-falantes que insistem em passar sob minha janela, desesperadamente, dou-me conta de que algo está perdido.
Seria eu?
Tento encontrar algum resquício de familiaridade nessa imagem prostrada no espelho, mas não a reconheço. A expressão refletida me é totalmente ignota.
Os olhos são ausentes.
Não há intensidade. E sem intensidade, não há o ser.
Onde fui esconder-me, Senhor a quem desconheço?
Busco nas lembranças qualquer centelha de vida que me faça, ao menos, recordar quem um dia fui...
E então, semblantes desfiguram-se e configuram-se diante de meus olhos, que, estranhamente, estão fechados.
Mesmo assim eu vejo.
São rostos amigos.
Amigos que marcaram os segundos mais importantes de toda minha ignóbil existência.
Eles, porquanto, trouxeram-me o que de mais majestoso tinham. Trouxeram cor, luz e música.
E um pote cheio de mel.
E eu, pobre de tantas coisas, dei a cada um deles um fragmento da única coisa que possuía: um fragmento do amor que outrora inundou meu ser.
E ele brilhava tanto!
Meus amigos possuem o meu amor. Incondicional. Total.
E eu sonho (ó sim, eu ainda posso sonhar!) que assim, todos me carregam consigo. E que zelam pela coisa mais bonita que alguém um dia é capaz de ter.
E, quando a partida não mais puder ser adiada, de convicções levarei apenas esta: eu tive amigos!